Relatório da ONU, divulgado no segundo dia da COP28, destaca os estragos da seca prolongada causada por ações humanas. A África, que emite apenas 3% dos gases de efeito estufa, é a região do planeta mais afetada
Catástrofe climática silenciosa, a seca induzida por ações humanas coloca a Terra em uma “emergência sem precedentes”, com impactos que “apenas começam a se manifestar”, alertou um relatório divulgado nesta sexta-feira (1º/12) pela Convenção das Nações Unidas para o Combate à Desertificação (UNCCD) na COP28, a 28ª Conferência do Clima, em Dubai, nos Emirados Árabes. O documento reúne dados dos últimos dois anos e aponta que “pouco ou nenhum perigo ceifa mais vidas, causa mais perdas econômicas e afeta mais setores da sociedade que a seca”.
“Ao contrário de outras catástrofes que atraem a atenção pública, as secas acontecem em silêncio, muitas vezes passando despercebidas, não conseguindo provocar uma resposta política imediata”, lamenta Ibrahim Thiaw, secretário-executivo da UNCCD. “Esta devastação silenciosa perpetua um ciclo de negligência, deixando as populações afetadas suportando, sozinhas, o fardo.”
Ressaltando que espera que o documento sirva de alerta a negociadores e tomadores de decisões da COP28, Thiaw destaca que a estiagem prolongada afeta diversos aspectos socioambientais. “Com o aumento da frequência e gravidade dos eventos de seca, à medida que os níveis dos reservatórios diminuem e os rendimentos das colheitas caem, continuamos a perder diversidade biológica e a fome se espalha, é necessária uma mudança transformacional.”
Agropecuária
Entre os dados compilados pela ONU, a situação da bacia do Rio Prata, entre Brasil e Argentina, é destacada. Segundo o documento, em 2022, a estiagem foi a mais severa dos últimos 78 anos, o que reduziu a produção de alimentos e afetou os mercados agrícolas globais. O engenheiro florestal André Ferretti, analista de projetos ambientais da Fundação O Boticário de Proteção à Natureza, que integra o Observatório do Clima, lembra que a desertificação afeta um dos principais motores da economia brasileira. “A desertificação acaba resultando em sérios problemas econômicos para região e para o país também, além de impossibilitar ou reduzir drasticamente a produção agropecuária, impactando o PIB (produto interno bruto)”, diz Ferretti.
O relatório da ONU mostra que, no ano passado, 630 mil quilômetros quadrados, o equivalente às áreas combinadas de Itália e Polônia, foram impactados pela seca na Europa. Foi a estiagem mais grave no continente em 500 anos, diz o documento, citando dados do Fórum Econômico Mundial. Em decorrência desse extremo climático, 70% das culturas de cereais foram danificadas no Mediterrâneo entre 2016 e 2018.
No continente africano, o relatório aponta a insegurança alimentar seguida da queda de produtividade agrícola na Etiópia, no Quênia e na Somália, que, em 2022, registraram a pior seca em quatro décadas. As perdas econômicas da África diretamente associadas à estiagem nos últimos 50 anos foram estimadas em US$ 70 milhões.
Gestão sustentável e restauração do solo; práticas agrícolas positivas para o meio ambiente, como culturas resistentes, métodos de irrigação mais eficientes e outras práticas de conservação do solo são algumas medidas urgentes citadas no documento. “A preparação para catástrofes e os sistemas de alerta precoce também são essenciais para a resiliência global à seca. Investir na monitorização meteorológica, na recolha de dados e em ferramentas de avaliação de riscos pode ajudar a responder rapidamente às emergências de seca e minimizar os impactos”, diz o relatório.
Discursando ontem na COP28, o presidente do Quênia, William Ruto, destacou os impactos negativos da seca no Chifre da África, seguida, agora, por chuvas torrenciais. “Inundações catastróficas se seguiram rapidamente à seca mais severa que a região viu em mais de 40 anos. Evidências científicas ligam clara e fortemente estes eventos climáticos extremos ao clima induzido pelo homem”, lembrou. “Estudos indicam que as secas são agora pelo menos 100 vezes mais prováveis em algumas partes da África do que eram na era pré-industrial.” Apesar de sofrer os efeitos das alterações climáticas, o continente produz menos de 3% do CO2 lançado anualmente na atmosfera.
Fonte e foto: https://www.correiobraziliense.com.br/ – (crédito foto: Mwangi Kirubi/Divulgação )
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