Durante séculos, os conclaves do Vaticano se desenrolam como se o tempo ali dentro obedecesse a uma lógica própria, alheia à pressa do mundo moderno. Entre os muros sagrados, o ritmo é outro — e as regras, imutáveis como dogmas.
Nada de smartphones, redes sociais ou vídeos vazados: o silêncio impera absoluto, e a confidencialidade é mais do que uma norma — é um voto sagrado. Nos bastidores da Santa Sé, movimentações discretas moldam aquele que é considerado o processo mais reservado do planeta.
Na Capela Paulina, um juramento coletivo foi prestado não apenas pelos cardeais, mas também por todos que, de alguma forma, estarão próximos do conclave. De médicos a cozinheiros, de ascensoristas a funcionários da limpeza — todos prometeram, de mãos sobre as Escrituras, guardar total sigilo sobre qualquer detalhe ligado à eleição papal. A penalidade para quem quebra esse pacto é das mais severas: excomunhão.
Durante os dias do conclave, os cardeais eleitores ficarão reclusos na Casa Santa Marta, transformada mais uma vez no epicentro da decisão. O prédio foi inteiramente desocupado; os demais hóspedes transferidos para paróquias afastadas. Apenas um nome destoará: o do cardeal Angelo Acerbi, de 99 anos, que permanecerá no local, embora já sem direito a voto.
A Capela Sistina, onde ocorrerá a votação, foi isolada de qualquer influência externa. Sem sinal de celular, sem televisão, sem jornal. Dispositivos que bloqueiam transmissões foram instalados tanto no local do escrutínio quanto na residência dos cardeais. Antes do início oficial, uma varredura minuciosa será feita por técnicos em busca de escutas ou câmeras ocultas. O zelo é total, a liturgia rígida.
Ainda assim, o cotidiano na clausura não é de privação absoluta. À mesa, os cardeais desfrutam do estilo italiano: entradas, pratos principais, sobremesas e, discretamente, vinho. Mas há regras na cozinha também. Nada de frangos inteiros ou bolos — qualquer objeto que possa esconder mensagens é proibido.
As diretrizes que regem esse processo foram esculpidas ao longo dos séculos. Coube ao Papa Gregório X, em 1274, fixar o modelo do conclave moderno: portas trancadas, comunicação cortada e prazos bem definidos. Após ter vivido na pele um conclave que durou quase três anos, ele impôs medidas rigorosas: três dias para deliberar, depois disso, jejum progressivo. No oitavo dia, apenas pão, vinho e água.
Hoje, sem a necessidade do aperto alimentar, espera-se um desenlace mais rápido. Internamente, muitos cardeais expressam o desejo por um pontífice próximo do povo, com sensibilidade pastoral e capacidade de dialogar com os dilemas contemporâneos.
Enquanto o mundo espera, os olhos se voltam ao céu de Roma. No alto da Capela Sistina, uma pequena chaminé — singela e carregada de simbolismo — será a voz do silêncio. Quando a fumaça escura se transformar em branca, o anúncio será feito sem palavras: a Igreja terá um novo pastor.
Fonte: https://caiogottlieb.jor.br/?p=9462


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